Eleições municipais do Brasil terão o menor número de candidatos desde 2012 e crescem os temores de maior polarização por parte do bloco X

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Urna eletrônica em Brasília, Brasil (REUTERS/Adriano Machado/Arquivo)
Urna eletrônica em Brasília, Brasil (REUTERS/Adriano Machado/Arquivo)

Faltam duas semanas para as eleições municipais no Brasil. Começou a contagem regressiva para o evento político mais importante do país, no dia 6 de outubro, antes das eleições presidenciais de 2026. 5.569 municípios elegerão seus prefeitos e vereadores para os próximos quatro anos, indicados por 29 partidos. Apenas 103 municípios poderão passar para o segundo turno, como exige a legislação brasileira, por terem mais de 200 mil habitantes. Em comparação com as eleições anteriores, muitas novidades surgiram tanto no número de candidatos como nos temas do programa, num cenário muito polarizado.

463 mil candidatos inscritos, o menor número desde 2012. Apenas 15 mil concorrem a prefeito, número que não se via desde 2004. Para o cientista político da Universidade de Brasília Robson Carvalho é “um sintoma da crise da democracia” porque em 214 municípios há apenas um candidato a prefeito. Ele precisa apenas de um voto para ser eleito, segundo a justiça eleitoral do gigante latino-americano. O estado com maior número de candidatos únicos, 61% em relação ao resto do país, é o Rio Grande do Sul, seguido por Minas Gerais, São Paulo e Goiás. Como se não bastasse, 72% dos candidatos únicos concorrem a um segundo mandato. Os homens são maioria, 66% contra 34% das mulheres. Quase 47% dos candidatos inscritos se declaram brancos, mulatos 40% e negros apenas 11%. Os candidatos indígenas, 2.479, não chegam a 1% do total.

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Cinco mil candidaturas foram rejeitadas pela justiça eleitoral por não cumprirem os critérios de elegibilidade, nomeadamente as dos chamados Lei da Ficha Limpa (Arquivo Limpa em português). De acordo com esta lei, aqueles que foram condenados em segundo grau não podem concorrer às eleições. Uma investigação de site de notícias G1 revelou que até 61 candidatos se inscreveram nas eleições de 6 de outubro, apesar de haver um mandado de prisão pendente contra eles. Entre eles também estão alguns procurados pela invasão de prédios institucionais em Brasília no dia 8 de janeiro de 2022. Nos últimos dois dias, a Polícia Federal prendeu 19 deles, alguns acusados ​​de tráfico de drogas, corrupção e porte ilícito de armas de fogo.

Além disso, esta semana, a Justiça Eleitoral do Rio de Janeiro autorizou a candidatura do Fernanda Costaatual vereador do Movimento Democrático Brasileiro (MDB) em Duque de Caxias. Fernanda Costa é filha de Fernandinho Beira Mar, chefe de um dos mais importantes grupos criminosos do país, o Comando Vermelho (CV).. De acordo com o jornal Folha de São Pauloa mulher foi condenada em abril de 2023, em primeira instância, pela Justiça Federal de Rondônia, acusada de atuar como “braço social e político” do pai e atualmente recorre. “A decisão contraria as recentes ações dos magistrados na tentativa de impedir a participação de pessoas ligadas a organizações criminosas nas eleições. Os desembargadores rejeitaram a inscrição de pelo menos cinco candidatos que não tiveram condenação confirmada pelos órgãos colegiados, como exige a Lei da Ficha Limpa. Também há casos de rejeição de pessoas sem acusação formal”, explica. Folha de São Paulo.

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Urnas eletrônicas no Brasil (REUTERS/Ueslei Marcelino)
Urnas eletrônicas no Brasil (REUTERS/Ueslei Marcelino)

A situação no estado de Rio de Janeiro é muito crítica devido à influência – que corre o risco de transbordar até nos colégios eleitorais – tanto do milícias paramilitares a partir do traficantes de drogas dos grupos organizados que historicamente dominam a Cidade Maravilhosa, como o Comando Vermelho, o Terceiro Comando Puro (TCP) e os Amigos dos Amigos (ADA). No Rio de Janeiro, o atual prefeito, Eduardo Paesdo Partido Social Democrata (PSD), e Alexandre Ramagemdo Partido Liberal, o PL de Bolsonaro, do qual é muito próximo. Ex-comissário da Polícia Federal e chefe da equipe de segurança durante sua campanha eleitoral em 2018, Ramagem chefiou a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) entre julho de 2019 e março de 2022. A questão da segurança continua sendo um dos principais assuntos dessas eleições, tanto na preocupação de limitar a influência no voto dos cidadãos, especialmente no Rio de Janeiro, e na agenda eleitoral. Os cidadãos, não apenas nas grandes metrópoles brasileiras, pedem aos candidatos programas eficazes para resolver o aumento geral da violência, incluindo os roubos de telemóveis, que se tornaram uma praga nacional. Em abril, um levantamento realizado nos municípios do Nordeste do Ceará pelo instituto de população Opnus colocou a segurança pública como terceiro tema prioritário, atrás apenas da saúde pública e da geração de emprego e renda. Na cidade de São Paulo, uma pesquisa realizada em junho pela Genial Pesquisas e pelo Instituto Quaest (Genial/Quaest) mostrou que a violência é o tema mais citado pelos entrevistados. As respostas dos políticos na campanha eleitoral foram múltiplas, desde o aumento da presença policial nas zonas periféricas até ao aumento dos salários dos policiais.

Na campanha para prefeito da capital financeira do país, São Paulo, O crime organizado foi até uma questão eleitoral utilizada por vários candidatos durante debates televisivos para atacar Pablo Marçala verdadeira novidade destas eleições. Candidato pelo Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB), Marçal foi recentemente atingido por uma cadeira ao vivo por José Luiz Datenajornalista de televisão e candidato pelo Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), que o acusou repetidamente de trabalhar para o principal grupo criminoso do país, o Primeiro Comando da Capital (PCC). Ex-técnico de profissão, Marçal foi preso em 2005 durante a Operação Pégaso, que descobriu uma rede criminosa especializada em hackear contas bancárias de outras pessoas pela Internet. O candidato a prefeito foi condenado a quatro anos e cinco meses de prisão em regime semiaberto, mas seu caso caducou.

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O golpe de um candidato a prefeito de San Pablo a seu rival durante um debate na televisão

Segundo cientistas políticos, Marçal representa uma nova fase da política brasileira, ou melhor, “Bolsonarismo sem Bolsonaro”com temas e linguagem de direita muito caros ao bolsonarismo, como família, pátria e religião, mas sem o apoio político do ex-presidente, que o criticou diversas vezes. Na verdade, de acordo com as sondagens, Marçal, com o seu apelo contínuo “aos valores cristãos”, está a roubar a Bolsonaro o seu histórico eleitorado evangélico. De acordo com a última pesquisa de DataFolha, Entre os evangélicos, Marçal tem 31% de intenção de voto, seguido pelo atual prefeito Ricardo Nunesdo Movimento Democrático Brasileiro (MDB), que conta com o apoio do ex-presidente, com 29%. Em comparação com Bolsonaro, que se referia principalmente aos líderes evangélicos, os pastores, houve uma mudança de estratégia, com Marçal a dirigir-se diretamente aos fiéis, usando a sua própria linguagem. “Marçal representa um sentimento ainda mais profundo na sociedade brasileira, que não é apenas antissistema, como Bolsonaro, mas antipolítica.” […] “Ele é um outsider muito mais extremo”, explica o cientista político Eduardo Grin ao site de notícias. Agência Brasil. Na mesma pesquisa Datafolha desta semana, o candidato do PRTB ocupa o terceiro lugar nas intenções de voto, com 19%. O atual prefeito, Ricardo Nunes, e Guilherme Boulos, do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), brigam pelo primeiro lugar, o primeiro com 27% e o segundo com 26%.

Quanto a Jair Bolsonaro, seu irmão Renato e dois de seus filhos concorrem nestas eleições. Para eles, o Partido Liberal já investiu 2,7 milhões de reais, US$ 498 mil, segundo o jornal O Estado de São Paulo. É sobre seus filhos Jair Renanque concorre a vereador em Balneário Camboriú, em Santa Catarina, e de Carlosque mais uma vez concorre à Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Seu irmão Renato é candidato a prefeito de Cartóriocidade de 60 mil habitantes no estado de San Pablo, para onde seus pais se mudaram na década de sessenta.

Lula e Jair Bolsonaro aguardam essas eleições
Lula e Jair Bolsonaro aguardam essas eleições

Quanto a Lula, nestas semanas de campanha eleitoral, ele privilegiou sobretudo a cidade de San Pablo e apoiou Boulos que concorre para se tornar prefeito da metrópole tendo Marta Suplicy como vice. Este político de longa data regressou ao Partido dos Trabalhadores, o PT de Lula, após um interlúdio não partidário como secretário de Relações Internacionais de São Paulo, no governo Nunes. Foi justamente o PT que investiu 30 milhões de reais, 5,5 milhões de dólares, na campanha eleitoral de Boulos e Suplicy, tentando recuperar as cadeiras perdidas nas duas eleições municipais anteriores devido à operação anticorrupção Lava Jato.

E agora muitos se perguntam se a proibição de X no Brasil, em curso desde 30 de agosto e apoiada por Lula e pelo PT, se tornará um bumerangue para o presidente e seu partido. Na quinta-feira, o juiz do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes -que decidiu bloquear a rede social em sua guerra contra Musk- ordenou que a Polícia Federal investigasse todos os cidadãos brasileiros que entrassem no X usando VPN, para aplicar multas de 50.000 reais (9.213 dólares) por dia. Este cenário corre o risco de inflamar ainda mais o debate político para estas eleições, com repercussões que poderão custar caro ao Brasil nos próximos meses, também a nível internacional. Mário Sabino escreva no site de notícias Metrópoles: “A censura do Twitter é ridiculamente inútil. E pode ser prejudicial para o Brasil se Donald Trump for eleito presidente dos Estados Unidos. Porque é provável que, em resposta à interrupção da empresa do seu amigo Elon Muskameaça criar barreiras à entrada de produtos brasileiros nos Estados Unidos. Toda essa agitação para quê? De jeito nenhum”. Por sua vez, a Proton, multinacional que comercializa serviços VPN, que protegem as conexões de Internet e a privacidade online, anunciou em comunicado que os oferecerá gratuitamente no Brasil às vésperas das eleições municipais de 6 de outubro “para garantir o acesso gratuito a informação para todos e evitar qualquer tentativa de interferência ou campanha de desinformação”.

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