Para o cineasta espanhol José Ortizcadastre o ausência de pessoas desaparecidas em um série documental foi um dos aspectos mais desafiadores ao filmar o caso do 43 estudantes de Ayotzinapa.
No próximo dia 26 de setembro completam-se 10 anos do ocorrido em Iguala, Guerreiroquando 43 alunos da Escola Normal Rural desapareceram ‘Raul Isidro Burgos’. Uma década depois do ocorrido, a busca pela verdade e pela justiça parece não ter fim, pois o paradeiro dos jovens ainda permanece uma questão.
Nesse contexto, José Ortiz falei com Infobae México sobre as circunstâncias que o levaram a dirigir O Ayotzinapa 43: um crime estatalsérie documental da Warner Bros Discovery que está prestes a estrear na plataforma Máx.
Neste projeto, o cineasta dá voz às mães e familiares dos alunos desaparecidos e os contrasta com depoimentos de autoridades mexicanas envolvidas nos acontecimentos, como Tomas Zerónex-diretor da Agência de Investigação Criminal (AIC) exilado em Israel.
Além disso, combina material de arquivo com novos depoimentos e entrevistas de pessoas que pela primeira vez prestam depoimento sobre o ocorrido, como a filha de José Luis Abarcaex-prefeito de Iguala que esteve relacionado ao desaparecimento dos estudantes. Essa pluralidade de vozes é o que, segundo José Ortiz, diferencia esta documentalização de outros trabalhos realizados anteriormente.
“Um dos objetivos que estabelecemos desde o início, vendo os trabalhos audiovisuais que foram realizados até então, foi ouvir a voz dos governantes mexicanos que na época tinham que investigar o caso. Se eu tivesse que destacar algo é que estavam presentes todas as vozes (…) que seriam os sobreviventes e protagonistas que estiveram muito próximos e que vivenciaram os acontecimentos em primeira mão”, declarou José Ortiz.
–Como retratar ou registrar a ausência de pessoas desaparecidas em uma narrativa audiovisual?
-Desde o início era como um elemento narrativo ou algo que estava ali, um emoção que queríamos transmitir. Acho que levamos isso em consideração a nível visual, por exemplo, quando estávamos na escola e gravamos cenas em que dava para ver uma calça pendurada naquelas crianças que hoje estão naquela escola. Um pouco para retratar aquele espaço onde eles estavam e sinta essa ausência com essas imagenscom aqueles planos que registramos.
Além disso, o tratamento dispensado às mães nas entrevistas. Não queríamos entrevistar muitas pessoas porque nos parecia que não poderíamos aprofundá-las. Acreditamos que esta ausência ou aquele sentimento de ausência é o mesmo que todos partilham porque perderam os filhos.
Então acho que a gente mergulhou bastante nesse sentimento nas entrevistas, sempre com eu respeitosem buscar a morbidade, de forma que se sentissem confortáveis no seu espaço, no local onde moravam com os filhos. Acho que o importante é isso, estar no mesmo lugar onde ainda estava a moto do seu filho ou onde havia elementos que estavam lá antes.
-Como manter a objetividade diante da pluralidade de vozes que se integram na docuseries?
-Acho que abordar cada entrevista de maneiras muito diferentes. Exige um trabalho de pré-produção muito forte, vendo tudo o que aquela pessoa comentou, se não comentou, ou seja, fazer uma entrevista que seja personalizada para aquela pessoa específica da melhor forma para depois extrair toda aquela narrativa que você precisa deles.
Acredito que a experiência também vai longe e não dar nada como garantido porque isso permite ser mais objetivo. Não fique condicionado à entrevista e trate sempre com o máximo respeito possível aquela pessoa, seja ela quem for, um sobrevivente ou uma pessoa sobre quem há muitas surpresas.
Esteban Vidalprodutor executivo da série, anunciou como a Warner Bros Discovery abordou o caso do desaparecimento dos 43 estudantes de Ayotzinapa e o interesse em abordá-lo em um produto audiovisual.
“Nós da Warner Bros Discovery temos um objetivo principal que é buscar histórias de impacto relevantes que geram debate e conversa na região e em cada um dos países onde temos alcance. Esse objetivo era essa história que queríamos colocar na tela”, comentou em entrevista ao Infobae México. Acrescentou que parte do interesse em produzir a série documental tem a ver com a 10 anos que passaram desde o desaparecimento dos estudantes.
“Um dos fatores que nos fez decidir produzir esta série foi que para janelas temporárias vimos isso como uma oportunidade e acreditamos que o comemoração de 10 anos É um bom momento para recapitular todos os fatos relacionados ao caso e colocá-los na tela. Aí se juntaram esses dois fatores: o nosso interesse em colocar temas importantes e relevantes na tela e também a janela de aproximação dessa comemoração de 10 anos”, explicou.
O terceiro fator que levou à criação da série foi a participação com o produtor Parque já trabalhou em outros projetos documentais sobre temas de relevância social, como o atentado 11 milhões na Espanha.
“Quando começamos a avaliar com quem trabalhar neste projeto, o experiência de Parr na investigação de questões complexas – política e humanamente – abriu caminho para acreditarmos que ela era a melhor alternativa para desenvolver um projeto desta magnitude (…) Par foi uma grande aliada, uma produtora com absoluto profissionalismo. A série é o melhor exemplo da qualidade deles como aliados”, disse Vidal.
O Ayotzinapa 43: um crime estatal Ele vai estrear na Max e na HBO em 5 de setembro às 21h. A série é composta por cinco episódios que serão transmitidos semanalmente.
Entre os depoimentos recolhidos estão os de Tomás Zerón, ex-chefe da AIC; Miguel Ángel Osorio Chongex-secretário do Interior, e Yazaret Abarcafilha do ex-prefeito de Iguala, José Luis Abarca. Da mesma forma, são retomadas entrevistas com jornalistas como Anabel Hernández e Peniley Ramírez, sem deixar de lado as vozes das mães dos 43 estudantes, seus colegas e sobreviventes do caso.